Mahadevi
Lendo e estudando diversos textos sagrados da Índia uma coisa pode
ser facilmente observada, Mahadevi ou a Mãe Cósmica, a Grande Deusa pode ser
considerada a Realidade Última do Universo. Ela é um poderoso ativo criativo feminino
transcendente Ser. Enquanto Shiva, seu consorte é o Um sem Segundo, Aquele que
fornece a semente, a Grande Deusa é o útero aonde tudo é gerado.
No Lalitha Sahasranama dá muitos nomes a Mahadevi, e em muitos
deles encontramos o significado muito além da compreensão da consciência
humana, como por exemplo, Jagatikanda (325) – a raiz do mundo; Visvadhika (334)
é aquela que transcende o Universo; Nirupama (389) ela é aquela que não tem
igual; Paramesvan (396) ela é a governante suprema; Vyapini (400) ela é aquela
que permeia tudo, Aprameya (413) ela é a Imensurável, Visvagarbha (637) ela é
aquela cujo seio contém todo o Universo, Sarvadhara (659) é a que dá apoio a
todos, SArvalokesi (758) ela é a
governante de todos os mundos ou como Visvadharini (759) é a que suporta todo o
Universo. A Ela são dedicados 1.000 nomes.
No Devi Bhagavad Purana, Ela é a mãe de todos. Ela permeia os três
mundos, apoiando a todo os que Dela necessitam (1.5.47-50); Ela é a força da
vida em todos os seres, a governante de todos (1.5.51-54); é a causa única do
Universo (1.7.27), Ela criou Brahma, Visnu e Shiva e mandou-os executar todas
as tarefas cósmicas (3.5.4); ela é o Supremo Conhecimento (4.15.12). Em todo o
Devi Bhagavad Purana encontramos muitos nomes e frases exaltando – A com a
posição da supremacia cósmica.
Ela é também Shakti – Feminino Primordial. Shakti é uma palavra
sânscrita que significa – Poder, nos textos sagrados indianos, principalmente
nos textos tântricos Shakti é a dimensão ativa da divindade, o poder divino que
existe na capacidade de criar o mundo, o poder divino dentro da totalidade.
Shakti é o pólo complementar que nos conduz à quietude e ao silencio divinos. O
outro pólo pertence ao seu consorte – Shiva que representa o poder divino
masculino ou Homem Primordial – Purusha. Os dois pólos têm natureza
interdependentes, e podem ser vistos na imagem de Ardhaniswara.
No Samkhya Mahadevi é Prakirti (o Feminino Primord ial) e Maya (a
Ilusão). Dois de seus epítetos mais comuns podem ser vistos em Mulaprakirti
(Matéria Primordial) e Mahamaya (Grande Ilusão). Ambos têm uma conotação
negativa na Filosofia Samkhya de Kapila e nos Sutras de Patanjali. Exercícios
de Yoga foram criados para reverter as tendências espontâneas de Prakirti para
reproduzir e especificar-se. A busca pela libertação de Prakirti representa a
busca pela própria liberdade do ser.
Da mesma forma, os textos sagrados, as Upanishads entre outros
identificam Maya como a Deusa que nos impede de ver as coisas tais como elas
realmente são. Maya é a força que sobrepõe os objetos da nossa própria
ignorância sobre o mundo, obscurecendo a Verdade Suprema, levando-nos a uma
existência de dor e sofrimento.
Por isso é imprescindível acordar para a Verdade das coisas tais
como são, e isso envolve neutralizar ou até mesmo superar o poder de Maya, um
poder que fundamenta na ignorância e na auto-obsessão. E o que libertação? No
pensamento filosófico indiano, liberdade significa a transcendência do mundo
encarnado, material, finito e da existência fenomenal. Viver neste mundo da
existência dos fenômenos, sentindo-se como um ser individual é viver envolto em
Maya.
Como Prakirti ou Maya, Mahadevi é a força cósmica que impulsiona
até mesmo os Devas à inconsciência e sono, vivemos como se estivéssemos
sonhando, sempre projetando nossas expectativas no passado morto ou no futuro
inexistente. O que precisamos é na verdade encontrar as dimensões positivas de
Prakirti ou de Maya e pararmos de nos preocupar com este mundo onde os
fenômenos existem independentes de nós. Podemos dizer que Mahadevi é a própria
Existência ou que Ela subjaz em todas as coisas existentes. Devemos parar de
colocá-la como sendo um aspecto do mundo tal como o vemos, mas vê-la como o
fundamento de todas as coisas existentes e inexistentes.
Porque quando a vemos como Ela realmente é, entendemos que Ela
permeia o mundo fenomênico como Prakirti ou mesmo como Maya e pode assim
expressar qualidades positivas. E isso acontece quando assumimos atitudes
positivas em relação ao mundo, tratando o mundo positivamente como ele merece.
Porque os textos sagrados nos ensinam que Mahadevi é o mundo, Ela é a criação,
Ela é uma com todas as criaturas de todos os reinos existentes, Ela é a
Criação. Identificar Mahadevi com a existência por si só é claramente adotar
uma atitude positiva em relação ao mundo em que vivemos. Porque Ela é a própria expressão da vida,e quando amamos e
reverenciamos a vida, estamos amando e reverenciando Mahadevi.
Como Shakti, Prakirti e Maya a Grande Mãe é retratada como uma
presença irresistível que transborda sua Energia, derramando seu Poder para
toda criação, inundando o mundo com Sua vitalidade, energia e poder. Quando
Mahadevi é identificada com estes pensamentos, então um ponto positivo está
sendo feito: Devi cria o mundo, Ela é o próprio mundo e Ela anima o mundo com
seu poder criativo. Ela é também a existência finita do mundo dos fenômenos,
mas é também a fonte e a vitalidade de todas as criaturas. E assim podemos
identificá-la como a Mãe, a Grande Mãe Cósmica. E quando reverenciamos seu
incrível poder vital estamos reverenciando a vida em nós e em nosso mundo.
Já nos tempos do Advaita Vedanta, vemos Devi associada à Brahman O
Absoluto. No Vedanta Brahman é a Realidade Última, e é descrito de duas
maneiras: Como Nirguna é Aquele que não tem qualidades e está além delas e como
Saguna é Aquele com qualidades.
Como Nirguna, Brahman é a Realidade Última que transcende todas as
qualidades, categorias, divisões e limitações. Como Nirguna, Brahman transcende
todas as tentativas de definição. Ele está além de tudo e de todo nome e forma
(Nama-Rupa).
Como Saguna, Brahman é o princípio fundamental da existência, mas
é também conhecido por suas qualidades e por sua manifestação em uma
multiplicidade de nomes, formas, divindades, universos, mundos e seres. Como
Saguna podemos vê-la em todas as divindades do panteão hindu. Como Saguna Ele é
a essência unificadora que subjaz em todos os deuses e deusas. Cada divindade é
vista como uma manifestação parcial de Brahman O Absoluto e que em ultima
análise está além de todos os atributos que as especificam, concedem funções e
qualidades.
Em muitos textos sagrados e principalmente nos tântricos onde Devi
ocupa a posição suprema do panteão hindu Ela se iguala à descrição de Brahman.
Existem dois pontos a serem considerados: 1) Ela é a própria Realidade Última e
2) Ela é a fonte de todas as manifestações divinas, tanto masculinas como
femininas, mas especialmente as femininas.
Como Saguna Brahman, Mahadevi é considerada como a Rainha Cósmica,
entronizada no mais alto ponto dos céus, tendo uma multiplicidade de divindades
como súditos e é através deles que Ela governa os Universos Infinitos. Em
muitos textos Ela é Naguna Brahman, e apesar das características femininas Ela
está além de todas as qualidades, formas e nomes, muito além do masculino e do
feminino.
Podemos reverenciá-La entoando com fé e devoção inúmeros Mantram,
como o Gayatri – e talvez este seja seu maior presente a todos nós, devotos ou
não; pois este é um Mantra muito poderoso e que nos conecta diretamente com
Ela.
Podemos vê-La na beleza das flores, do pôr-do-sol ou nos raios da
Lua. Nas estrelas que brilham no fundo escuro do Universo, podemos vê-La no
olhar dos apaixonados e na alegria da cura. Mahadevi é Onisciente, Onipresente
e Oniponte!
Referencias:
·
Shakti And
Shakta – Sir Avalon
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