Estava dando uma prática de meditação
dinâmica para refugiados. Era uma forma de ajuda-los a liberar as tensões do corpo físico diante de tanto stress,
traumas e marcas de um passado doloroso. Estavam todos entregues ao exercício
proposto, atentos aos movimentos aliados à respiração. Uns com movimentos mais
duros, pareciam robôs dançando, outros que já estavam mais ambientados,
iniciando uma nova vida, deixando o passado para trás até onde é possível
dançavam mais soltos. Ao observá-los percebia como o corpo revela a história
pessoal de cada um. Como já não é mais possível fazer um trabalho psicológico
que não esteja de alguma forma compartilhada com o corpo físico, pois este
muitas vezes consegue dizer mais do que as palavras.
No entanto ao incentivá-los à prática meditativa passiva, onde o foco
passa a ser o silêncio mental, pude perceber as dificuldades de cada um ainda
mais visível. Eu já sabia por experiência que seria muito difícil mantê-los
naquela postura por um tempo mínimo necessário para que o silêncio mental produzisse os efeitos benéficos que a prática
produz. Mal consegui mantê-los por mais que cinco minutos em uma postura ereta,
com a respiração nasal e o corpo tranquilo e relaxado.
Ao compartilharmos os sentimentos e sensações
após a prática, o que mais ouvi foi a dificuldade de não pensar, de manter o
silêncio mental, de apenas observar a respiração e o fluxo de energia. Até mesmo
as freiras que participavam da dinâmica, supostamente mais tranquilas alegaram
a dificuldade de manter este estado de vazio pleno de tudo.
O silêncio mental aprofunda meu entendimento
de quem eu sou, de onde eu vim e para onde eu vou, questões muito importantes
para o autoconhecimento, principalmente quando estamos atravessando momentos de
obstáculos, transformação, medos, isolamentos entre tantas experiências que
movimenta nossa loucura interna. Ele também ajuda a manter a mente focada e a
despertar o corpo, ajuda a acalmar e vencer as forças que nos ameaçam
constantemente na vida cotidiana.
Nossa mente está sempre inundada de imagens e
sons ou vozes assustadoras, são as
nossas próprias cobranças, pressões e
agitações. Como é difícil manter a calma por alguns minutos que sejam para
podermos fazer as melhores escolhas, tornar o caminho mais claro e até onde for
possível manter o controle dos nossos projetos. O silêncio mental ativa a
consciência sensorial, e é através dela que recuperamos o nosso sentido de
segurança no mundo em que vivemos. Permite-nos
também lidar com os traumas, as coincidências oníricas, os sentimentos de
presságios. Acima de tudo posso deixar de ser o sapo na panela quente, sempre
arrumando uma desculpa para pular fora enquanto é tempo e buscar uma outra
saída que não seja a de ser cozinhada pela água fervente.
Poucas são ainda as pessoas que se
possibilitam participar de um retiro de meditação, na verdade de proporcionarem
a si mesmas um encontro mais profundo e revelador com o seu Self para poder
responder as perguntinhas básicas: Quem sou eu? De onde eu vim? Para ponde
estou indo? O que estou fazendo aqui?
Um retiro é antes de tudo a possibilidade de
reduzir o clamor da vida diária, é a oportunidade de fazer descobertas, de
despertar emoções e experiências poderosas, de aprender a regular ou cultivar o
equilíbrio emocional, de levantar o tapete e sacudi-lo para libertar tantas
emoções e histórias a muito tempo escondidas. Sentar-se por algum tempo, de
forma disciplinada e correta para vivenciar o silencio mental, intermediado por
aulas ou outras práticas enriquecedoras, respirar um ar mais puro que o das
grandes cidades, proporcionar a si – mesmo um auto encontro fortalecedor.
Percebi naquele momento que se fosse possível levar todos eles para passarem dois ou três
dias distantes de tantos momentos difíceis eles com certeza voltariam com um
olhar diferente para um mundo novo que se abre. Da mesma forma que quando
apenas escuto um paciente falando de sua angústia no consultório imagino quanto
mal causam as emoções desequilibradas e a dificuldade de parar por um momento
diariamente para balanceá-las.
Todas as vezes que levei alunos das turmas de
Mindfulness ou da Oficina de Meditação e Saúde, obtive um incentivo ainda maior
para continuar a proporcionar este encontro com o Self. É logico que sempre tem
um ou outro aluno que não gosta do que encontra, que na verdade preferia não
ter levantado o tapete, e eu me pergunto como é difícil buscar a transformação.
Outros, no entanto, fazem profunda descobertas, provocam mudanças de
comportamento e crenças negativas. Quando retornam às aulas de meditação
conseguem revelar o quando o silêncio mental deixou de ser assustador mas
tornou-se fortalecedor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário