terça-feira, 21 de julho de 2015

O silêncio Mental

Estava dando uma prática de meditação dinâmica para refugiados. Era uma forma de ajuda-los a liberar as tensões  do corpo físico diante de tanto stress, traumas e marcas de um passado doloroso. Estavam todos entregues ao exercício proposto, atentos aos movimentos aliados à respiração. Uns com movimentos mais duros, pareciam robôs dançando, outros que já estavam mais ambientados, iniciando uma nova vida, deixando o passado para trás até onde é possível dançavam mais soltos. Ao observá-los percebia como o corpo revela a história pessoal de cada um. Como já não é mais possível fazer um trabalho psicológico que não esteja de alguma forma compartilhada com o corpo físico, pois este muitas vezes consegue dizer mais do que as palavras.
No entanto ao incentivá-los  à prática meditativa passiva, onde o foco passa a ser o silêncio mental, pude perceber as dificuldades de cada um ainda mais visível. Eu já sabia por experiência que seria muito difícil mantê-los naquela postura por um tempo mínimo necessário para que o silêncio mental  produzisse os efeitos benéficos que a prática produz. Mal consegui mantê-los por mais que cinco minutos em uma postura ereta, com a respiração nasal e o corpo tranquilo e relaxado.

Ao compartilharmos os sentimentos e sensações após a prática, o que mais ouvi foi a dificuldade de não pensar, de manter o silêncio mental, de apenas observar a respiração e o fluxo de energia. Até mesmo as freiras que participavam da dinâmica, supostamente mais tranquilas alegaram a dificuldade de manter este estado de vazio pleno de tudo.

O silêncio mental aprofunda meu entendimento de quem eu sou, de onde eu vim e para onde eu vou, questões muito importantes para o autoconhecimento, principalmente quando estamos atravessando momentos de obstáculos, transformação, medos, isolamentos entre tantas experiências que movimenta nossa loucura interna. Ele também ajuda a manter a mente focada e a despertar o corpo, ajuda a acalmar e vencer as forças que nos ameaçam constantemente na vida cotidiana.

Nossa mente está sempre inundada de imagens e sons  ou vozes assustadoras, são as nossas próprias cobranças, pressões  e agitações. Como é difícil manter a calma por alguns minutos que sejam para podermos fazer as melhores escolhas, tornar o caminho mais claro e até onde for possível manter o controle dos nossos projetos. O silêncio mental ativa a consciência sensorial, e é através dela que recuperamos o nosso sentido de segurança no mundo em que vivemos.  Permite-nos também lidar com os traumas, as coincidências oníricas, os sentimentos de presságios. Acima de tudo posso deixar de ser o sapo na panela quente, sempre arrumando uma desculpa para pular fora enquanto é tempo e buscar uma outra saída que não seja a de ser cozinhada pela água fervente.

Poucas são ainda as pessoas que se possibilitam participar de um retiro de meditação, na verdade de proporcionarem a si mesmas um encontro mais profundo e revelador com o seu Self para poder responder as perguntinhas básicas: Quem sou eu? De onde eu vim? Para ponde estou indo? O que estou fazendo aqui?

Um retiro é antes de tudo a possibilidade de reduzir o clamor da vida diária, é a oportunidade de fazer descobertas, de despertar emoções e experiências poderosas, de aprender a regular ou cultivar o equilíbrio emocional, de levantar o tapete e sacudi-lo para libertar tantas emoções e histórias a muito tempo escondidas. Sentar-se por algum tempo, de forma disciplinada e correta para vivenciar o silencio mental, intermediado por aulas ou outras práticas enriquecedoras, respirar um ar mais puro que o das grandes cidades, proporcionar a si – mesmo um auto encontro fortalecedor.

Percebi naquele momento que se fosse possível  levar todos eles para passarem dois ou três dias distantes de tantos momentos difíceis eles com certeza voltariam com um olhar diferente para um mundo novo que se abre. Da mesma forma que quando apenas escuto um paciente falando de sua angústia no consultório imagino quanto mal causam as emoções desequilibradas e a dificuldade de parar por um momento diariamente para balanceá-las.


Todas as vezes que levei alunos das turmas de Mindfulness ou da Oficina de Meditação e Saúde, obtive um incentivo ainda maior para continuar a proporcionar este encontro com o Self. É logico que sempre tem um ou outro aluno que não gosta do que encontra, que na verdade preferia não ter levantado o tapete, e eu me pergunto como é difícil buscar a transformação. Outros, no entanto, fazem profunda descobertas, provocam mudanças de comportamento e crenças negativas. Quando retornam às aulas de meditação conseguem revelar o quando o silêncio mental deixou de ser assustador mas tornou-se  fortalecedor.

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