Meditação Tonglen
Uma oportunidade de desenvolver uma melhor relação com as outras
pessoas.
Tonglen é
uma técnica de meditação do Budismo Tibetano que faz parte dos ensinamentos do
Dozgchen. É uma prática simples, porém muito poderosa, pois produz um efeito
curativo. Para praticá-la, não é necessário, no entanto, ser um praticante de
avançado em meditação, pois ela não exige um conhecimento profundo da filosofia
budista, mas ela exige um ser grau de coragem.
Por que
coragem? É incrível como somos pessoas divididas por nossos sentimentos
positivos e negativos, podemos até não reconhecer. É comum observar no
consultório, como é doloroso reconhecimento da capacidade de sentir raiva ou
mesmo ódio por alguém. A coragem nos convida a um compromisso real com a
situação e com as pessoas que serão envolvidas na técnica. Este compromisso
pode com certeza transformar nosso comportamento e nosso olhar sobre o outro, e
assim desenvolver a compaixão.
A prática da
meditação Tonglen é tão envolvente que pode tornar-se um hábito saudável,
porque ela cura a nossa dor e a do outro também. Hoje conhecemos praticas
meditativas dinâmicas ou passivas. Eu considero na verdade o Tonglen como uma
meditação “ativa”, pois podemos praticá-la durante nossas atividades diárias,
fora do horário da pratica normal da meditação, em qualquer momento. Apenas tento
todo o cuidado de não praticar o Tonglen quando estivermos dirigindo, ou
exercendo uma atividade muito perigosa.
Nas aulas da
Oficina de Meditação e Saúde, para os alunos iniciantes eu incentivo sempre a
manutenção da qualidade de presença, ou seja, manter-se consciente do momento
presente. Uma forma de desenvolver esta
qualidade é manter-se focado na respiração natural. Observando a inspiração e a
expiração, sentindo a presença no aqui e agora, procurando diminuir o diálogo
interno. Procurando não entrar no jogo da mente, nem se distrair com o fluxo
das emoções que possam surgir. Tornar-se um observador de si – mesmo.
Para um
praticante de meditação mais avançado busco incentivar a busca pela realidade
por detrás das ilusões, que o Budismo denomina de Shunyata, e que um praticante
de Dozgchen poderia chamar de Clara Luminosidade da Mente.
É comum um
praticante de meditação passar por experiências de percepções sensoriais,
sentir-se tomado por pensamentos ruminantes ou sentimentos reprimidos. A lição
é sempre não dar valor para estas experiências e retornar de forma calma e
tranqüila ao estado de Atenção Plena – Mindfulness – usando a respiração como
foco, a mente consciente do momento presente.
Estando
nesta qualidade de presença, observe uma pessoa estranha que esteja no momento
passando por uma experiência muito adversa da sua, uma situação dolorosa como
alcoolismo, uso de substâncias entorpecentes ou qualquer outra situação que te
cause incomodo pelo simples fato dela existir. Não use os seus conceitos ou
pré-conceitos para julgar ou criticar, apenas procure se colocar no lugar dela
use seus cinco sentidos para entrar em sintonia, sentir seu sofrimento, sua
angústia, seu conflito interno. É o que Tonglen chama de entrar em sintonia com
outro – Neutro – uma pessoa que passa por nós na rua, que não conhecemos de
quem nada sabemos, que muitas vezes até evitamos.
Além desta
pessoa, podemos ter outra com que temos uma relação conflituosa. Aqui pode
imperar sentimentos como a raiva, agressão ou outro sentimento negativo.
Escolha para a prática do Tonglen, aquela cujo relacionamento causa um profundo
incomodo. Não elabore mentalmente nenhum julgamento moral, nem retribua
sentimentos negativos. Pare por um momento, faça a sua prática meditativa e
busque sintonizar-se com ela, coloque-se no lugar dela e sinta a sua dor. É o
que o Budismo chama de entrar em sintonia com o inimigo.
É muito
importante manter-se num estado não-dual à medida que você vai se sintonizando
com o outro. Neste momento podemos sentir a compaixão vibrar no Cakra Anahata
(Cardíaco) de forma profunda e natural. Este profundo sentimento vai - nos
envolvendo à medida que vamos dando espaço. Não tenha receio, mantenha-se
aberto e receptivo à compaixão pela pessoa escolhida.
Aprofundando
a prática do Tonglen, quando estiver entrando em sintonia com a pessoa
escolhida, procure inspirar e expirar todos os sofrimentos pelos quais a pessoa
esteja passando. Absorva o sofrimento no Cakra Anahata, imagine que ao fazer
este exercício você está também aliviando a dor do outro, substituindo a
angústia e o conflito por amor e esperança. Imagine que você está aliviando o
fardo do outro, tornando a vida dele mais leve, frutífera e feliz.
Embora não
deva ser o objetivo ultimo, ao praticarmos o Tonglen estamos criando um bom
karma, tanto para nós mesmos como para o outro. O que vale mesmo é pensar que a
cada ciclo de inspiração e expiração, o sofrimento é substituído pela cura.
Shantideva, um mestre budista ensina sobre o Estado de Boddhicitta, chama este
ato de – o coração de uma mente iluminada.
A intenção e a ação conjunta têm o efeito de dissolver o apego que nos afasta
da verdadeira natureza de todas as coisas.
O Estado de
Boddhicitta tem a capacidade de dissolver o karma negativo nosso e do outro e
desatar os nós que nos mantêm unidos na situação conflitante, eliminando o
estado de servidão ou ignorância que nos mantêm presos muitas vezes por várias
vidas.
A prática do
Tonglen deve ser diária. Seria maravilhoso se tornasse um hábito, a cada
pensamento de critica o julgamento diante de qualquer situação ou
relacionamento conflituoso. Faz nascer a compaixão por todos. Praticar o
Tonglen com que amamos é fácil, difícil é abraçar a causa de dissolver os
incômodos que perturbam nossas vidas e mantêm a nossa mente num diálogo
interminável e doentio. Com o tempo praticamos o Tonglen envolvendo todo o
planeta. Provocamos uma maravilhosa mudança de comportamento à nossa volta.
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